História
No plano lendário, há quem pretenda associar os Açores à Atlântida, mítico reino insular citado por Platão. Já num plano histórico, encontram-se alusões a nove ilhas em posições aproximadas das açorianas no oceano Atlântico, em livros e mapas cartográficos desde meados do século XIV. Mas é com a epopeia marítima portuguesa, liderada pelo Infante D. Henrique, que os Açores entram de forma definitiva no mapa da Europa. Desconhece-se se terá sido Diogo de Silves, em 1427, ou Gonçalo Velho Cabral, em 1431, o primeiro navegador a atingir o arquipélago. A origem do nome Açores é igualmente ponto de várias teorias. A mais divulgada associa a designação aos milhafres encontrados, então confundidos com outra ave de rapina: o açor. Certo é que o Infante D. Henrique impulsiona a humanização das ilhas. Primeiro com o lançar de animais, entre 1431 e 1432, depois pelo envio de colonos, a partir de 1439.
Desde então, o povoamento estende-se ao longo dos séculos XV (grupos oriental e central) e XVI (grupo ocidental). Judeus, mouros, flamengos, genoveses, ingleses, franceses e escravos africanos unem-se à gente de Portugal Continental para enfrentar os duros obstáculos da tarefa.
A empreitada épica forja um povo que, ao longo de séculos, resiste a erupções vulcânicas e terramotos, isolamento, invasões de piratas, guerras políticas, doenças infestantes. A resistência ao domínio espanhol na crise de sucessão dinástica de 1580 e o apoio à causa liberal na guerra civil (1828-1834) são reveladores da coragem dos açorianos. Já no século XX, esta bravura sobrevive na epopeia baleeira, quando os homens se lançam em pequenos botes de madeira para o confronto no imenso mar azul com os cachalotes agigantados.
|
|
Santa Maria
Há quem atribua a Diogo de Teive o primeiro contacto português com a ilha, provavelmente em 1427. Outros defendem o nome de Gonçalo Velho Cabral, navegador e freire da Ordem de Cristo, como revelador da terra, em 1431. Quase certo é que Santa Maria terá sido o contacto inicial com o arquipélago açoriano, constituindo o primeiro esforço de povoação insular, por volta de 1439, altura em que o capitão-donatário Gonçalo Velho e um grupo de colonizadores fixam amarras na Praia dos Lobos. O ingresso de novas famílias provenientes de Portugal Continental, principalmente do Algarve e Alentejo, contribui para o desenvolvimento de Santa Maria, de tal forma que a localidade do Porto é a primeira nos Açores a receber o foral de vila. A economia local assenta então no cultivo do pastel, planta tintureira da qual se extrai um corante azulado, utilizado para tingir têxteis na distante Flandres; na produção de trigo, base essencial da alimentação da época; e na extracção de barro, utilizado para a produção de loiças e telhas.
Em 1493, acostam a Santa Maria as naus de Cristovão Colombo, no regresso da primeira viagem de descoberta da América. Os desembarques de outros navios estrangeiros serão mais ferozes durante os séculos XVI e XVII, época de sucessivas pilhagens da ilha por corsários ingleses, franceses, turcos e árabes do Norte de África. Em 1616, vive-se sob ocupação moura durante quase uma semana. Segundo a lenda, parte da população refugia-se na Furna de Santana para fugir aos saques, incêndios, torturas e raptos. Também em 1675, piratas mouros regressam em força à baía dos Anjos e, quando partem, levam prisioneiros para vender como escravos.
Passado o fulgor das exportações para a indústria têxtil, os séculos XVIII e XIX são marcados pelo fomento das culturas da vinha, trigo, milho, pomares de fruta, batata e inhame, a par da pecuária e dos lacticínios. Apesar dos tempos calmos, a economia de subsistência da ilha convida parcelas da população à emigração. O século XX traz outra dinâmica e progresso, sustentados na construção do aeroporto. Iniciada em 1944, à força de milhares de braços americanos e açorianos, a estrutura era considerada estratégica pelos Estados Unidos na luta anti-submarina da Segunda Guerra Mundial. Findo o conflito bélico, o aeroporto veste fato civil e transforma-se em escala dos aviões que atravessam o Atlântico. Em finais da década de 1960, os novos jactos com maior autonomia de voo deixam de tocar em Santa Maria. No entanto, mantém-se intacto o papel de grande centro de controlo do tráfego aéreo sobre o Atlântico. Actualmente, os Serviços são a base da economia, seguidos das actividades agro-pecuárias e piscatórias. |
São Miguel
Terá sido entre 1427 e 1431 que navegadores portugueses descobrem São Miguel, logo após Santa Maria. O povoamento inicial data da década de 1440, sob a liderança de Gonçalo Velho Cabral, e é efectuado com colonos oriundos das regiões do Norte, Estremadura, Algarve e Alentejo. Posteriormente chegam comunidades de mouros, judeus e alguns estrangeiros, nomeadamente franceses e ingleses. Os solos férteis e a existência de algumas baías seguras rapidamente tornam a ilha num entreposto comercial. O crescimento económico sustenta-se essencialmente no cultivo e exportação de trigo e de pastel, que dinamizam o povoamento desta ilha.
A capital é Vila Franca do Campo até ao terramoto de Outubro de 1522, o qual deixa um rasto de destruição por toda a localidade. Ponta Delgada assume, então, um papel primordial, sendo elevada a categoria de cidade em 1546. O final do século XVI é marcado por ataques de corsários e São Miguel é ocupada por tropas espanholas em 1582, no contexto da resistência açoriana às forças militares do novo rei de Portugal, Filipe II de Espanha. Após a Restauração da Monarquia Portuguesa, em 1640, o desenvolvimento comercial ganha novo fôlego, estreitando-se a ligação ao Brasil
A exportação da laranja, principalmente para a Grã-Bretanha, constitui a principal fonte de enriquecimento entre o século XVIII e meados da centúria seguinte. Datam desta altura grande parte das igrejas com rica talha dourada e dos solares de refinada cantaria que hoje deslumbram os visitantes. A dizimação dos laranjais por doenças infestantes, a partir de 1870, reduz drasticamente a produção e leva a um surto de emigração da população para o Brasil e para os Estados Unidos.
A introdução de novas culturas – ananás, chá, tabaco, espadana – dinamiza a expansão económica do século XIX. A economia micaelense mantém-se pujante no século XX, principalmente devido ao desenvolvimento da agro-pecuária, que alimenta parte da indústria transformadora de lacticínios. Todavia, a partir da década de 1980, o progresso do sector terciário foi sendo cada vez mais notório, ocupando actualmente a maioria da população micaelense. Nesta vertente, o turismo é uma das apostas mais recentes de São Miguel, ilha que serve de sede ao Governo Regional dos Açores. |
Terceira
A terceira paragem do arquipélago a ser reconhecida por navegadores portugueses, provavelmente entre finais de 1420 e inícios de 1430, começa por ser designada Ilha de Jesus Cristo. O posterior rebaptismo para Terceira leva em conta a ordem das descobertas anteriores, Santa Maria e São Miguel. O povoamento é mais tardio do que no grupo oriental, pois só em 1449 o Infante D. Henrique incumbe Jácome de Bruges, flamengo de nascença, de humanizar a ilha. Apesar deste primeiro investimento, o efectivo povoamento da ilha só terá sido realizado a partir de 1470, tendo como zonas centrais Praia e Angra, que gizaram o aparecimento de povoações pelo resto do território.
Nos séculos XV e XVI, a relevância da baía de Angra não só é notória como entreposto comercial interno, promovendo o circuito de produtos regionais produzidos nas demais ilhas, como assume ainda maior protagonismo como escala inter-continental para as naus que navegavam entre a Europa e as distantes América e Índia. A cidade de Angra, fundada em 1534, torna-se o fulcro político, económico e religioso dos Açores e a ela abundam metais preciosos e especiarias exóticas que tornam a ilha num alvo privilegiado e continuado de corsários ingleses, franceses, castelhanos e flamengos.
Em 1580, perante a subida ao trono de Portugal do rei espanhol Filipe II, os terceirenses apoiam as pretensões de D. António, Prior do Crato, candidato português. Espanha procura debelar a rebelião, mas o primeiro desembarque de tropas castelhanas, em 1581, resulta na sua pesada derrota na famosa Batalha da Salga. Dois anos depois, os hispânicos regressam em maior número e alcançam o domínio insular após violentos combates. Com a Restauração de 1640, Portugal recupera a independência e a Terceira solidifica a sua posição central no arquipélago.
O espírito de bravura dos locais volta a ser testado durante as Guerras Liberais. Maioritariamente adepta da causa liberal, a população terceirense reage contra o domínio absolutista, já comodamente instalado noutras paragens. Em 1829, uma feroz batalha naval termina com a derrota das tropas absolutistas de D. Miguel que tentavam desembarcar no areal da Praia. Perante o feito, esta vila passa a ser conhecida por Praia da Vitória. Durante este conturbado período histórico, a Terceira funciona como base para D. Pedro IV organizar a reconquista do trono e consolidar a monarquia constitucional. Angra é nomeada capital do reino de Portugal e obtém o acrescento “do Heroísmo”. Em 1832, assiste-se à largada da armada e exército rumo ao continente, onde desembarcará na praia do Mindelo, momento chave na vitória do ideal liberalista.
Durante a Segunda Guerra Mundial, permite-se aos britânicos instalarem uma base militar próxima da Praia da Vitória, que posteriormente passa para a Força Aérea Norte-Americana. A conhecida e ainda hoje operante Base das Lajes traz novas influências aos habitantes locais. Ciosa do passado histórico repleto de grandes feitos, a Terceira mantém-se actualmente uma ilha dinâmica no contexto do arquipélago, tendo o centro histórico angrense sido reconhecido, em 1983, como Património Mundial da Humanidade, pela UNESCO. |
Graciosa
O ano do descobrimento português da Graciosa é incerto. Julga-se que terá sido identificada em 1427, a par das demais ilhas do grupo central, e que na década de 1430 terá sido lançado na ilha algum gado diverso, de acordo com a ordem emanada pela Coroa portuguesa. O povoamento oficial e continuado terá ocorrido por volta de 1470, provavelmente a partir de dois núcleos distintos, um liderado por Vasco Gil Sodré, na zona de Santa Cruz; e outro liderado por Duarte Barreto, na zona da Praia. Em 1485, Pedro Correia da Cunha já é indicado como capitão de toda a ilha, tendo promovido a vinda de novos colonos de Portugal Continental e também da Flandres. Num movimento de sul para norte, as planícies de solos férteis do interior são consecutivamente ocupadas. Esta consolidação demográfica beneficia primeiro a localidade de Santa Cruz, que recebe foral de vila em 1486; seguida pela Praia, também conhecida por São Mateus, que é elevada a vila em 1546. A economia local sustenta-se na agricultura. Trigo e, a título quase excepcional no seio do arquipélago, a cevada são produções do século XVI. Para além da recolha de urzela, a vitivinicultura assume cada vez maior protagonismo, com a aguardente e o vinho locais a serem apreciados e consumidos dentro e fora da ilha. As relações comerciais centram-se na Terceira, porto fulcral do arquipélago. E tal como a ilha vizinha, a Graciosa é atacada e pilhada por piratas durante os séculos XVI e XVII.
Períodos de seca e desastres naturais são episódios marcantes e constantes da história da Graciosa, causando um empobrecimento generalizado. A par do que sucede nas demais ilhas, o cultivo do vinho sofre um declínio assinalável durante o século XIX, face ao aparecimento do oídium e da filoxera, doenças das videiras que afectam grande parte da produção. Entre as décadas de 1950 e 1970, um surto de emigração para os Estados Unidos empobrece o panorama sócio-económico da ilha. Um movimento de união cooperativa com vista a recuperar parte da tradição e cultura vinícola culmina, em 1994, na criação da Região Demarcada da Graciosa. Actualmente, a produção de lacticínios e carnes é fulcral na actividade económica da ilha. O terreno muito parcelado dá ainda guarida a milho, produtos hortícolas e árvores de fruto.
Na década de 1980, a construção do aeródromo e do porto comercial da Praia abrem novas perspectivas de futuro, com a Graciosa a plantar-se também ela nos caminhos do turismo sustentável.
|
São Jorge
Dada a proximidade com a Terceira, crê-se que navegadores portugueses terão deparado com São Jorge em conjunto com as outras ilhas que a rodeiam. Tudo indica que o povoamento terá começado por volta de 1460, sendo a segunda ilha do grupo central a ser habitada. Passada uma década, já estão instituídos vários núcleos populacionais nas costas oeste e sul, incluindo Velas. A chegada do nobre flamengo Wilhelm Van der Haegen, em 1480, assinala a fundação da comunidade do Topo, na extremidade este.
Em 1483, a capitania da ilha em franco desenvolvimento é doada a João Vaz Corte Real, então capitão de Angra, na Terceira. O foral de vila é concedido a Velas no final do século XV, benesse estendida ao Topo em 1510 e à Calheta em 1534. A prosperidade assentou no trigo, mas desde cedo a ilha também se destacou pela qualidade das suas pastagens.
Votada a um certo isolamento por ausência de portos seguros, São Jorge não adquire grande protagonismo económico. Nos séculos XVI e XVII, recebe as visitas indesejadas de corsários ingleses e franceses e dos impiedosos piratas turcos e argelinos. Fica famosa a incursão do francês Du-Gray-Trouin nas Velas, em 1708. Derrotado pela resistência heróica da população, este corsário retira-se de São Jorge com perdas elevadas na tripulação.
Entre os séculos XVI e XIX, a vida dos habitantes é fustigada por crises agrícolas, que geram escassez de alimentos, e por sismos e erupções vulcânicas, que causam destruição assinalável. A economia acompanha o modelo agro-pecuário das restantes ilhas: cultura de trigo e vinhas; recolha de urzela; criação de gado que cedo gera importantes sectores secundários ligados ao queijo e lãs. A actividade piscatória assume importância entre finais do século XIX e século XX, primeiro através da baleação e, desde a década de 1960, por via da pesca de atum. Actualmente, a excelência das pastagens de São Jorge reflecte-se na produção de um queijo típico fabricado com leite de vaca cru, com Denominação de Origem Protegida, constituindo esta ilha uma Região Demarcada para a produção do queijo de São Jorge. A existência de um aeroporto e de portos modernos nas Velas e na Calheta contribuem para a integração plena de São Jorge no arquipélago e no mundo. |
Faial
Presume-se que o descobrimento português da ilha terá ocorrido após o mapeamento da Terceira. O seu nome terá sido inspirado na abundância de faias-da-terra encontrada. Os primeiros povoadores oficiais, de origem flamenga e portuguesa, deverão ter chegado por volta de 1465, realizando uma primeira expedição em busca de estanho e prata, mas que não teve êxito. Dois anos depois, o nobre flamengo Josse Van Huertere regressa ao Faial e, atraído pela fertilidade dos solos, torna-se capitão do donatário português em 1468. Sob autorização real de D. Afonso V, traz novos colonos da Flandres que habitam o Vale dos Flamengos antes de se instalarem na Horta.
Os estrangeiros introduzem o cultivo do pastel na ilha. As exportações da planta tintureira e de trigo representam, durante dois séculos, os esteios da economia faialense. A ocupação espanhola em 1583 e os ataques dos corsários, principalmente franceses e ingleses, marcam um período de delapidação do património e riqueza da ilha. A erupção vulcânica de 1672-1673 também provoca elevada destruição na zona noroeste da ilha.
A bonança do século XVII, após a Restauração, surge em forma de porto de abrigo. A Horta transforma-se num entreposto da navegação entre a Europa e o continente americano, devido às condições da sua baía e à valorização da exportação do vinho produzido na ilha do Pico. Este, a par do vinho e aguardente originários das uvas de São Jorge e Graciosa, é comercializado para o reino, Europa e colónias britânicas. No século XVIII, a ilha também participa no ciclo de produção e exportação da laranja, fonte de enriquecimento do arquipélago. O porto da Horta vive uma época dourada, servindo de escala de abastecimento para os vapores que cruzam o Atlântico e para a frota baleeira norte-americana.
Em meados do século XIX, doenças infestantes dizimam vinhedos e laranjais no espaço de uma década. Mas graças à sua localização, a ilha transforma-se num centro nevrálgico de telecomunicações. A transmissão de informações entre a América do Norte e a Europa efectua-se por cabos telegráficos submarinos amarrados na cidade da Horta, cuja rede inaugural data de 1893. Sucessivamente, diversas companhias internacionais instalam cabos submarinos que ligam os continentes com passagem pela ilha. De igual modo, o Faial ganha dimensão logo no início do século XX, com a conclusão da construção do Observatório Meteorológico na Horta, em 1915.
A aviação também aproveita a posição privilegiada do Faial, escala dos primeiros hidroaviões que atravessam o Atlântico Norte, tendo o primeiro passado pela Horta logo após o final da primeira Guerra Mundial, em 1919. Na década de 1930 e 1940, as importantes companhias de aviação alemã, britânica, francesa e norte-americana escolhem a ilha como local de amaragem dos respectivos hidroaviões.
O aproveitamento desta benesse geográfica manteve-se até aos nossos dias. A marina da Horta, inaugurada em 1986, é um dos portos de abrigo mais famosos do mundo. Com a instituição do modelo autonómico, a cidade da Horta tornou-se sede do Parlamento Regional dos Açores e acompanhou as alterações económicas regionais, desenvolvendo o sector terciário, em detrimento dos demais. |
Pico
A descoberta da ilha por navegadores portugueses terá ocorrido a par das demais ilhas do grupo central. Inicialmente conhecida por Ilha de D. Dinis, o actual nome surge face à maior montanha portuguesa que aí se localiza. Pensa-se que o Pico terá sido a última ilha do grupo central a ser povoada, num esforço concretizado principalmente a partir da década de 1480.
Colonos provenientes de Portugal Continental, após escala na Terceira e Graciosa, escolhem as Lajes como primeiro local de residência. As plantações de trigo e da planta tintureira do pastel, por influência do vizinho Faial, são frágeis esteios do desenvolvimento económico durante o primeiro século de povoamento. Com efeito, o clima seco e quente de algumas zonas da ilha, em conjunção com a riqueza mineral dos solos de lava, contraria o traço agrícola desta ilha, mas permite um crescente sucesso da cultura da vinha, com predomínio da casta verdelho. Aos poucos, o vinho e a aguardente picoenses destacam-se entre a produção vinícola açoriana e tornam-se apreciados dentro e fora da ilha, permitindo o desenvolvimento da vitivinicultura, particularmente ao longo do século XVIII. Exportado para a Europa e para a América, o verdelho atinge fama internacional. Chega inclusive a marcar presença na mesa dos czares russos.
A ligação com o Faial é forte, não só no plano administrativo, como económico. Por um lado, a Horta funciona como porto de exportação dos produtos do Pico, que carece de enseadas seguras. Por outro, até à crise vinícola do século XIX, um elevado número de proprietários de terras picoenses provinha da ilha vizinha. O primeiro quartel do século XVIII é marcado por erupções vulcânicas de monta, espécie de prenúncio para o término do período dourado do verdelho. Em meados do XIX, o ataque devastador do oidium e da filoxera extingue a maior parte dos vinhedos. Perdido o cultivo, esfumada a tradição e prestígio, cresce a emigração dos habitantes locais para o Brasil e América do Norte. Como alternativa, parte dos que ficam viram-se para o mar.
Desde o século XVIII que a ilha tem contacto com a actividade baleeira. Frotas inglesas e norte-americanas procuram o cachalote nas águas em redor do Pico. As barcas utilizam os portos da ilha para descanso da tripulação, abastecimento de mantimentos, estaleiros de reparação e posto de recrutamento de novos braços para a dura batalha contra os gigantes do mar. Surgem na segunda metade do século XIX os primeiros intentos da comunidade local para abraçar a actividade. A caça ao cachalote prospera e alastra a outras ilhas do arquipélago. A dinâmica mantém-se até meados do século XX, altura que marca o declínio da actividade. O ponto final surge em 1986, o definitivo impedimento da caça aos cetáceos, na sequência da assinatura pelo Estado português da moratória proibitiva da Comissão Baleeira Internacional.
Recuperando tradições seculares e reinventando-as, o Pico mantém hoje em dia uma ligação estreita com o cachalote. O contacto com os cetáceos, agora protegidos, é pedra de base da indústria turística. E a vitivinicultura voltou a ter alguma importância, auxiliando a economia da ilha onde os serviços, a agricultura, pecuária e pesca são actividades relevantes. A singularidade da vinicultura picoense é reconhecida internacionalmente, com a classificação da Paisagem da Cultura da Vinha como Património Mundial da Humanidade, pela UNESCO, em 2004. |
Flores
A descoberta portuguesa das ilhas do actual grupo ocidental deverá ter ocorrido por volta de 1452. Aponta-se Diogo de Teive como navegador responsável por encontrar tão “distante” território. A designação de Flores pensa-se estar associada à abundância de flores naturais registadas na ilha logo na década de 1470. Não foi fácil o povoamento da Ilha. Aliás, a individualidade geográfica do grupo ocidental espelha-se na sua configuração política, pois, ao contrário das suas congéneres insulares, Flores e Corvo são constituídas como um senhorio individualizado que o rei D. Afonso V entrega em 1453 a seu tio, D. Afonso, duque de Bragança e conde de Barcelos.
Também nas Flores os primeiros esforços de povoamento têm origem flamenga, designadamente por via de Willem van der Haghen, que se fixara inicialmente na ilha de São Jorge, e que resolve tentar a sorte em paragens ainda mais ocidentais, por volta de 1480. Seja por ter ficado desiludido com o potencial económico da ilha, seja pelo isolamento em relação ao resto do arquipélago, o certo é que a experiência fracassa e o flamengo regressa a São Jorge. Abandonado durante anos, o território terá de esperar até 1508 para um povoamento bem sucedido, agora face ao esforço dos capitães da família Fonseca. Assim, apesar do povoamento tardio, o crescimento demográfico consolida-se. Lajes das Flores vê-se elevada a vila em 1515 e Santa Cruz das Flores recebe foral semelhante em 1548. A partir de finais do século XVI, a mão dos Mascarenhas irá projectar ainda mais o desenvolvimento demográfico das Flores.
Tal como em grande parte do arquipélago, o cultivo de cereais representou o suporte económico durante um par de séculos, também alimentado pela criação de ovelhas, produção de panos e pesca.
Ao longo dos séculos XVI e XVII, a ilha vive tranquila e isolada, condição posta em causa pelas frequentes visitas indesejadas dos corsários. As Flores, o ponto mais ocidental da Europa, usufruindo assim de um posicionamento táctico de grande relevância, funcionava como ponto estratégico para a Coroa apoiar logisticamente os navios oriundos do Pacífico e Índico. Em consequência, a ilha era alvo de vigilância cerrada por parte de corsários e piratas, que à sua volta aguardavam serenamente a passagem dos galeões espanhóis carregados de metais preciosos retirados das Américas e das naus portuguesas oriundas do Oriente.
A escrita oitocentista de Lord Alfred Tennyson perpetuou no poema The Revenge este longínquo tempo de aventuras e pilhagens navais. “At Flores in the Azores Sir Richard Grenville lay” começa o relato da heróica derrota do barco comandado pelo corsário inglês Sir Richard Grenville perante uma frota espanhola. A partir de meados do século XVIII, as Flores funcionam como porto de abrigo das armadas baleeiras inglesas e norte-americanas, em busca de mantimentos e homens para as tripulações. A influência externa conduz à criação de bases de caça ao cachalote nas Lajes das Flores e Santa Cruz das Flores. Ainda existem as instalações então edificadas para a extracção do óleo das baleias.
A inauguração do aeroporto em 1972 e a construção de instalações portuárias modernas levaram à maior integração do Grupo Ocidental no Arquipélago dos Açores. O sector terciário suporta a economia da ilha, ocupando cerca de 60% da mão-de-obra graciosense, campo no qual o turismo tem vindo a assumir crescente valorização. |
Corvo
O avistamento do Corvo pelo navegador português Diogo de Teive terá ocorrido em 1452, na mesma altura em que as Flores foram descobertas. Devido à dimensão, o pequeno território não desperta grandes atenções por parte dos povoadores dos Açores. O estado natural quase puro é quebrado em meados do século XVI, quando o capitão-donatário Gonçalo de Sousa envia um grupo de escravos para o Corvo, provavelmente oriundos de Cabo Verde, com a tarefa de se dedicarem ao cultivo da terra e criação de gado. Por volta de 1580, um contingente de colonos vindos das Flores aumenta a população local.
A vida no Corvo decorre serena, pautada pelos ritmos da agricultura, pesca e pecuária, de forma a garantir a subsistência da comunidade. Mas ao contrário do pressuposto, o posicionamento geográfico da ilha permite-lhe ultrapassar o seu expectável isolamento. De facto, o Corvo define a linha fronteiriça que reúne as Armadas portuguesas que para aí se dirigem para receber as naus oriundas dos vários pontos do Império português e espanhol e, a partir dai, acompanhá-las em segurança até à Europa continental. Por isso, o isolamento quebra-se no final do século XVI e durante todo o século XVII, muitas vezes pela frequente chegada de corsários e piratas em busca de saque e reféns. No Corvo, encontram valorosa resistência, sendo histórica a derrota sofrida em 1632 pelos piratas oriundos da Barbária, no norte de África. A população recorre ao arremesso de pedras para rechaçar a invasão. Reza a lenda que os corvinos tiveram ajuda na dura e desigual batalha por parte da padroeira Nossa Senhora do Rosário, que “desviava todos os tiros mandados pelos piratas e devolvia-os, multiplicados, para os barcos dos mouros, conseguindo pô-los em desbarate”. Desde então, a santa fica conhecida por Nossa Senhora dos Milagres.
A bravura dos habitantes do Corvo é novamente demonstrada em 1832, quando um grupo de corvinos se dirige à Terceira, para pedir o alívio do pesado tributo pago ao donatário da ilha e à Coroa. O ministro do rei D. Pedro IV, Mouzinho da Silveira, que se encontrava a organizar a luta liberal a partir de Angra, mostra-se impressionado com a escravidão vivida pelos corvinos. Propõe a anulação do imposto em dinheiro e redução para metade o pagamento em trigo. No mesmo ano, a povoação é elevada a vila e sede de concelho, passando a denominar-se Vila do Corvo.
Os séculos XVIII e XIX trazem os baleeiros americanos até à costa das ilhas do Grupo Ocidental. Alguns corvinos são recrutados para a caça ao cachalote e ganham reputação como corajosos arpoadores. Em 1864, o Corvo tem quase 1100 habitantes, mas o decréscimo populacional será, desde então, cada vez maior. Entre 1900 e 1980, o Corvo passa de 808 habitantes para 370, diminuição esta provocada principalmente pela emigração para os Estados Unidos e Canadá.
A inauguração do aeródromo do Corvo, em 1983, será crucial para a modernização das estruturas do Corvo. Em 1991, o estabelecimento de rotas áreas regulares com as Flores, Faial e Terceira promove a plena integração da ilha na dinâmica do Arquipélago. A actividade agro-pecuária, centrada na criação de gado bovino, é a actual trave mestra da economia local. |
|
|